Posted: 26 Jan 2009 06:28 PM CST Em comemoração aos seus 75 anos, a Universidade de São Paulo (USP) disponibilizou novas obras para consulta em sua Biblioteca Digital de Obras Raras e Especiais. Entre os livros, obras anteriores à sua fundação, como textos do século 15 e 16. São 38 títulos em várias áreas do conhecimento, obedecendo aos critérios de antiguidade, valor histórico e inexistência de novas impressões ou edições do título. Alguns desses foram digitalizados integralmente e estão disponíveis para consulta ou impressão para uso não comercial, enquanto outros tiveram apenas suas capas digitalizadas. Entre os títulos está o Liber Chronicarum, uma história do mundo escrita em 1493, ricamente ilustrada e colorida à mão, com texto em gótico e notas manuscritas, além de Ordenações de Dom Manuel, de 1539, livro que traz em sua primeira folha uma xilogravura representando as armas portuguesas. Mirela Portugal Fonte: A tarde On-line |
Usp disponibiliza obras raras em sua biblioteca virtual
sábado, 2 de outubro de 2010
Como sobreviver em debates literários pela internet:
1 - Faça uma lista de autores e críticos literários reconhecidos como clássicos e fundamentais. Dê preferência aos que não foram traduzidos em português ou àqueles cujas obras são raras de serem encontradas por aqui.
2 - Faça outra lista de citações de cada autor e crítico. Novamente, dê preferência às que não estão em português. Se for em latim, ainda melhor. As em português devem ser excessivamente obscuras, mas com um vocabulário que evidencie erudição.
3 - Separe as frases por assunto para que possam ser facilmente acessadas. Se não conseguir, navegue por sites e blogs para descobrir que expressões são comuns e eleja quais frases se enquadrariam ali.
4 - Ao utilizar a caixa de comentários dos sites e blogs, sempre ataque. Nada de propor questões ou parecer hesitante. Mostre estar sempre certo em tudo que diz. Cite os autores da primeira lista e reforce suas certezas com frases da segunda. Por exemplo, redija frases como "evidentemente o Brasil é muito ignorante e não leu Mendelssohn Heïgen-Bahn que prova o que digo quando me refiro ao nativus omnis proba de orbis na obra Essays of Music Literary"
5 - Se algum outro leitor discordar de você, humilhe-o. Primeiro elegantemente, sugerindo que ele não leu o suficiente para sequer respirar perto de você. Se houver algum erro ortográfico, invalide o argumento dizendo que alguém com uma escrita tão ruim não merece resposta. Caso ele ainda insista, seja agressivo.
6 - Caso outros leitores apóiem o ponto de vista contrário, escreva comentários na caixa utilizando pseudônimos que, obviamente, apóiam sua opinião. Para que não fique tão evidente que é você mesmo, use web proxies.
7 - Se algo que escreveu foi completamente equivocado (por exemplo, você disse que Machado de Assis escreveu Iracema), diga que se trata de uma ironia e reclame que as pessoas são burras demais para perceber isso.
8 - Se nada disso der certo, puxe o saco do dono do blog.
9 - Se ainda assim não der certo, abra você mesmo um blog obscuro chamando a todos de facistas-nazistas-pseudo-intelectuais-iletrados e coloque um link para ele na caixa de comentários. Utilize um pseudônimo que indique que sua missão é 'revelar' a verdade, claro.
Fonte: Odisséia Literária
Quem é este homem?
Da revista Época:
Quem é este homem?
Biografia do jovem Stalin revela um personagem - misto de poeta, terrorista e dom-juan - muito mais fascinante do que se sabia. Pena que não seja ficção
Por Marcelo Musa CavallariIRRECONHECÍVEL Joseph Stálin fichado pela polícia em 1913. O passado de bandoleiro foi apagado pela história oficial |
Durante a revolução de 1905, que pôs fim ao absolutismo na Rússia, Trótski chefiava o Soviete de São Petersburgo e desafiava o poder do czar com seus discursos inflamados. Enquanto isso, escreveu Trótski anos depois, Stálin passava o tempo em um escritório despretensioso na Geórgia escrevendo artigos insossos para jornais.
Errado. Em 1905, Joseph Djugashvilli ainda não era Stálin. Mas, conhecido como Soso, Camarada Koba, o Padre, ou outros vários nomes tão falsos quanto Stálin, estava, às vezes literalmente, pondo fogo em sua Geórgia natal e no vizinho Azerbaijão, pólo petrolífero da Rússia pré-revolucionária.
Garimpando uma impressionante massa de documentos inéditos e pouco consultados até hoje, o historiador britânico Simon Sebag Montefiore montou em Young Stálin um retrato muito mais verossímil, e fascinante, que a personalidade gélida e sem graça que ele próprio desenvolveu assim que chegou ao poder. Sebag Montefiore já havia publicado Stálin: a Corte do Czar Vermelho, em que narra a vida no círculo do poder em torno de Stálin. Agora, o historiador volta a seu personagem. O Stálin pré-1917 que revela é um arruaceiro mulherengo que circulava no submundo do crime e das organizações revolucionárias de um império russo em decomposição. A encarnação perfeita do revolucionário sem medo da violência capaz de assumir a "vanguarda do proletariado" que Vladimir Lênin estava teorizando de seu exílio na Suíça.
Mas não foi a teoria de Lênin que criou Stálin. A figura nasceu do terreno fértil da Geórgia. Conquistada pela Rússia no fim do século XIX, a Geórgia se orgulhava de sua nacionalidade, de sua língua. Nunca deixou de sonhar com sua independência e cultivava a fama de seus rebeldes. Stálin nasceu em Gori, uma cidade na base do Cáucaso, cruzamento entre a parte européia e asiática do império russo. No bazar da cidade, armênios e tártaros se misturavam aos georgianos. Cristãos ortodoxos, muçulmanos e judeus compravam e vendiam o vinho, as frutas, as peles e os produtos de couro da região, levados e trazidos à cidade em lombo de burro ou caravanas de camelos.
Nos feriados religiosos, depois da missa, os habitantes de Gori praticavam o esporte oficial da cidade: briga. Organizados em dois times, trocavam socos e sopapos, começando com lutas individuais entre crianças, subindo até a categoria adulta. Aí eram todos contra todos até acabar o dia. Nos dias normais, gangues de crianças e adolescentes se dedicavam a brigar umas com as outras. Sem regras. Nas tumultuadas ruas da cidade, havia pouca segurança e muita oportunidade para um garoto arrumar encrenca. Soso, como Stálin era conhecido desde criança, não perdia nenhuma. Mas ele não era só líder de gangue. Era também aluno da escola mantida pela Igreja Ortodoxa Georgiana na cidade, dedicada a preparar os futuros seminaristas. Era uma raridade. Em geral, a escola só aceitava filhos dos padres ortodoxos, para os quais não há celibato. Filho de um sapateiro bêbado e violento que acabou abandonando a família, Stálin só conseguiu a vaga pelos esforços de sua ambiciosa mãe. E de seu talento incomum para os estudos. Na escola, o inteligente Soso não era só o melhor aluno, era também um excelente tenor e cantava no coro da igreja.
Perdeu a fé e aderiu ao marxismo quando já estava no seminário de Tiflis, capital da Geórgia, aos 20 anos. Daí para a frente, até a chegada ao poder, levou uma vida clandestina. Desprezava profundamente os intelectuais de esquerda. Mas não por se sentir inferior a eles intelectualmente. Continuava a estudar avidamente como se continuasse no seminário. Era capaz de ler Platão no original grego. Sebag Montefiore narra uma festa em que os companheiros socialistas do futuro Stálin se embebedavam. Ele se dedicava a estudar a biografia de Napoleão Bonaparte e anotar os "erros" cometidos pelo marechal que se tornou imperador da França. Stálin, já profundamente ambicioso, apenas achava que os intelectuais não faziam o que era necessário para que a revolução realmente acontecesse.
Ele fazia. Qualquer coisa. Assalto a banco, assassinato de inimigos, condenação e execução de traidores do grupo, incêndio criminoso, cobrança de taxa de proteção dos ricos empresários da Geórgia ou do Azerbaijão. Nada estava além dos limites de Stálin se a ação fosse render dinheiro, armas ou ganhos políticos para o Partido Bolchevique. E podia contar com a proteção de seus conterrâneos. Até os policiais da Geórgia ajudavam a esconder seus rebeldes da polícia secreta do czar russo.
O papel de chefe de quadrilha, quase como o de um mafioso, se combinava com o de ousado agitador de massas. Um dia depois de Stálin arrumar seu primeiro e único emprego como operário, na refinaria de petróleo do barão Rotschild, a empresa foi atingida por um incêndio. Stálin, provavelmente o mandante do crime, organizou o trabalho de apagar o fogo. Depois, foi cobrar dos patrões a gratificação de praxe. Diante da recusa dos administradores da refinaria, que sabiam ter sido um incêndio criminoso, Stálin chegou aonde queria. Deflagrou a primeira greve de petroleiros da Rússia.
''Stálin chegou ao poder como homem de violência e idéias, expert em banditismo e marxista devoto, mas, acima de tudo, ele acreditava em si próprio'' SIMON SEBAG MONTEFIORE, historiador, autor de Young Stálin |
Quando Lênin tomou o poder, em 1917, passou a contar cada vez mais com a brutal eficiência de Stálin. O veterano rebelde georgiano, então com 38 anos, mestre em disputar a liderança de todos os grupos de que participou, desde as gangues de rua de Gori, tinha tudo nas mãos quando Lênin, o único líder revolucionário que realmente seguiu, morreu. Graças ao trabalho de Sebag Montefiore, fica mais fácil entender o que veio depois. Stálin tomou o poder. E foi eliminando, um a um, os ex-companheiros de jornada até se tornar o ícone do totalitarismo. Do selvagem aventureiro que conquistava mulheres e escrevia poemas (que, aliás, não são ruins e pontuam, em tradução inglesa, o livro de Sebag Montefiore), Stálin guardou apenas a astúcia, a paranóia e a crueldade. Como personagem literário, o jovem Stálin de Sebag Montefiore é uma descoberta sensacional.
A falsa história nas escolas militares
Publicada em:16/06/2010 - Fonte: Carta O Berro
Recife (PE) - A reportagem "Livro do Exército ensina a louvar ditadura", publicada na Folha no último domingo, desperta uma necessidade que vai além desta coluna, porque exige um aprofundamento que misture o jornalismo, a literatura, a história e a vida de quem um dia foi professor.
Penso nos jovens dos Colégios Militares, nos rapazes e mocinhas ardorosos obrigados a decorar algo como uma História vazia e violentadora, a que chamam História do Brasil - Império e República, de uma Coleção Marechal Trompowsky. Da Biblioteca do Exército. O nome, a origem, o Marechal, por si, já não garantiriam um bom resultado. Estariam mais para pólvora que para a História. Mas não sejamos preconceituosos, ilustremos com o que os estudantes são obrigados a aprender, como aqui, por exemplo:
"Nos governos militares, em particular na gestão do presidente Médici, houve a censura dos meios de comunicação e o combate e eliminação das guerrilhas, urbana e rural, porque a preservação da ordem pública era condição necessária ao progresso do país."
Uma breve pesquisa aponta que esses livros servem a um ensino orientado pela Diretoria de Ensino Preparatório e Assistencial (DEPA), criado em ...1973, sim, naquele inesquecível ano da ditadura Médici. Ou naquele tempo do gestor democrático, segundo a orientação dada aos futuros militares. E não se pense que tal ensino está à margem da lei, não. Ele se apoia em um certo Art 4º do R-69. Percebem? A caserna legisla.
Mas não é assim, sem nada, pois a DEPA organiza a proposta pedagógica "de orientar o processo educacional e o ensino-aprendizagem na formação de cidadãos intelectualmente preparados e cônscios do seu papel na sociedade segundo os valores e as tradições do Exército Brasileiro" (Grifo do seu documento). Que valores seriam esses, além das idéias anticomunistas do tempo da ditadura?
Penso agora nesses jovens dos colégios militares mantidos com os olhos vendados, pois deles se oculta a violência e o terror sofridos por outros jovens, tão brasileiros, generosos e heróicos quanto eles hoje:
"Eremias se tornou um cadáver aos 18 anos: perfurado de balas, o rosto irreconhecível porque uma só ferida, os cabelos, tão úmidos, tão grossos por coágulos de sangue, davam a impressão de flutuar no chão seco. Nada havia naquele cadáver que lembrasse o jovem que eu conhecera. O menino que eu vira em 1968 não anunciava aquele fim. Eremias não era aqueles olhos apertados, a boca aberta à procura de ar, a lembrar um afogamento. Um estranho peixe, com os cabelos a flutuar no seco.
Eremias morreu como um herói, permitam-nos dizer. O aparelho onde estava caíra. Fora entregue por um outro jovem preso, que não suportara as torturas. Cercado por forças do Exército, Eremias sozinho resistiu. Resistiu à bala, sem nenhuma esperança".
Ou aqui, neste depoimento da advogada Mércia Albuquerque, que assim viu e viveu no tempo da gestão do presidente Médici:
"Soledad estava com os olhos muito abertos com expressão muito grande de terror, a boca estava entreaberta e o que mais me impressionou foi o sangue coagulado em grande quantidade que estava, eu tenho a impressão que ela foi morta e ficou algum tempo deitada e a trouxeram, e o sangue quando coagulou ficou preso nas pernas porque era uma quantidade grande e o feto estava lá nos pés dela, não posso saber como foi parar ali ou se foi ali mesmo no necrotério que ele caiu, que ele nasceu, naquele horror".
E também aqui, nesta personagem oculta aos estudantes:
"Maria Auxiliadora Lara Barcellos atirou-se nos trilhos de um trem na estação de metrô Charlottenburg, em Berlim... tinha sido presa 7 anos antes, em 1969, no Brasil. Nunca mais conseguiu se recuperar plenamente das profundas marcas psíquicas deixadas pelas sevícias e violências de todo tipo a que foi submetida. Durante o exílio registrou num texto... 'Foram intermináveis dias de Sodoma. Me pisaram, cuspiram, me despedaçaram em mil cacos. Me violentaram nos cantos mais íntimos. Foi um tempo sem sorrisos. Um tempo de esgares, de gritos sufocados, de grito no escuro".
Essa história trágica, mas ainda assim fecundante, o papel destruidor de vidas pela Ordem da ditadura militar não pode nem deve ser ocultado. Há um clamor cidadão contra. Os colégios militares não podem mais continuar independentes do Brasil, como se fossem ilhas inexpugnáveis à civilização. A continuar assim, assistiremos todos a uma nova tragédia, que não será mais civil, de paisanos, como antes. Pois os fósseis já não cabem mais na pele dos estudantes militares do novo tempo. Ainda que os fósseis atendam pelo nome de livros de História da Coleção Marechal Trompowsky.
Peça homenageia centenário da escritora Patrícia Galvão
quinta-feira, 30 de setembro de 2010
O Teatro Estadual Maestro Francisco Paulo Russo de Araras traz um espetáculo diferenciado
nessa sexta-feira, a partir das 20h.
A peça As Pagus homenageia a escritora, poeta e jornalista Patrícia Galvão, que completaria 100 anos em 2010. O título faz alusão à maneira com que ela era conhecida no meio artístico.
O trabalho de pesquisa, montagem e direção foi encabeçado pela atriz Christiane Tricerri, que também atua na peça ao lado de Majeca Angelucci.
O espetáculo foi criado a partir de textos da escritora e também de entrevistas, encenações e workshops realizados pelas duas atrizes, dando luz à ideia de múltiplas Pagus existentes em cada mulher Brasil afora.
No palco, Pagu Senhora está moribunda, quando Pagu Antropofágica pede à ela mais algumas horas de vida para relembrar e repensar seus instantes vividos intensamente em celas, hospitais, navios, países distantes, terras brasilis, seus amigos, amantes, filhos e sua vida jornalística, artística, política e teatral.
Triceri, que estreou profissionalmente no teatro em 1981, acumula papéis memoráveis e prêmios ao longo de sua carreira – entre eles, o de melhor atriz pela APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte). Na TV, participou da minissérie A Casa das Sete Mulheres, Anarquistas Graças a Deus e Cometa.
Os ingressos estão à venda na bilheteria do Teatro e custam R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia-entrada para professores, aposentados, pessoas acima de 60 anos e estudantes). Mais informações podem ser obtidas pelo telefone 3541-5969.
Formação intelectual e política de Patrícia Galvão (*)
2010-08-30 Adelto Gonçalves (**)Patrícia Rehder Galvão (1910-1962), nascida em São João da Boa Vista, interior do Estado de São Paulo, foi jornalista, escritora, animadora cultural e militante política. Como jornalista, trabalhou no Diário da Noite, A Fanfulla, Diário de S.Paulo, Correio da Manhã, A Tribuna, de Santos, e Agência France Presse, em São Paulo. Sua formação intelectual e política deu-se mesmo na década de 1930. Mas, como foram os anos 30? Ao contrário do que se diz, a chamada Revolução de 30 foi um golpe militar como outro qualquer e não constituiu revolução social nenhuma. Foi apenas uma rearrumação das elites no poder. Assim, os cafeicultores paulistas, que haviam sugado as tetas públicas durante toda a República Velha (1889-1930), tiveram de dar lugar também a oligarcas de outros Estados, enquanto Getúlio Vargas levava para o Palácio do Catete o modelo de governo implantado por Júlio de Castilhos (1860-1903) no Rio Grande do Sul por 30 anos que serviu para configurar o Estado Novo, de índole positivista. Algumas conquistas foram obtidas pelos trabalhadores à época, mas nada há que prove que, se a República Velha tivesse durado mais quinze anos, esses avanços não teriam acontecido. A rigor, o Brasil continuou o mesmo país atrasado, com legiões de excluídos e analfabetos. Para piorar, o getulismo representou a quebra da ordem constitucional. E logo se transformou em ditadura sem qualquer disfarce, com perseguições a seus desafetos. A jovem Patrícia Galvão levantou-se contra isso, aderindo ao Partido Comunista do Brasil (PCB), que, como sempre, nunca passou de uma seita, sem qualquer perspectiva de empolgar as massas e alcançar o poder. Iludida, como ativista política e membro do PCB, ela combateu a ditadura de Getúlio Vargas, o que lhe valeu 23 prisões. Depois da Segunda Guerra Mundial, ao visitar Moscou, desiludiu-se com o comunismo soviético, rompeu com o PCB, passando a defender um socialismo de linha trotskista. Lúcia Teixeira, no livro Croquis de Pagu e outros momentos felizes que foram devorados reunidos (Editora Cortez/Unisanta, 2004), reproduz um trecho do panfleto "Verdade & Liberdade" em que Pagu diz: "(...) Dos vinte aos trinta anos, eu tinha obedecido às ordens do Partido. Assinara declarações que me haviam sido entregues, para assinar sem ler (...). Mas, não haviam conseguido destruir a personalidade que transitoriamente submeteram. E o ideal ruiu, na Rússia, diante da infância miserável das sarjetas, os pés descalços e os olhos agudos de fome. Em Moscou, um grande hotel de luxo para os altos burocratas. Na rua, as crianças mortas de fome: era o regime comunista..." Pagu publicou os romances Parque Industrial (edição da autora, 1933), sob o pseudônimo Mara Lobo, considerado o primeiro romance proletário brasileiro, e A Famosa Revista (Americ-Edit, 1945), em colaboração com Geraldo Ferraz (1905-1979). Parque Industrial foi publicado nos Estados Unidos em tradução de K. David Jackson em 1994 pela University of Nebraska Press. Seus contos policiais, escritos àquela época sob o pseudônimo King Shelter e publicados originalmente na revista Detective, dirigida pelo dramaturgo Nelson Rodrigues (1912-1980), foram reunidos em Safra Macabra (Livraria José Olympio Editora, 1998). Em 1950, já desiludida com o PCB, saiu candidata a deputada estadual pelo Partido Socialista Brasileiro, sem ter sido eleita. A essa época, publicou em edição própria Verdade & Liberdade, panfleto de propaganda política em que denuncia os totalitarismos comunista e fascista, defendendo um socialismo democrático. Em sua fase madura, como animadora cultural, revelou e traduziu grandes autores até então inéditos no Brasil como James Joyce, Eugène Ionesco, Arrabal e Octavio Paz. Teve um trabalho marcante como incentivadora do teatro amador, especialmente em Santos, onde trabalhava no jornal A Tribuna, cuja redação era dirigida por seu marido, Geraldo Ferraz. O apelido Pagu foi-lhe dado pelo poeta modernista Raul Bopp (1898-1984), autor de Cobra Norato, que imaginou que seu nome fosse Patrícia Goulart. Ela mesma inventou muitos pseudônimos para si, como Zazá, Gim, Solange Sohl, Mara Lobo, Pat, Pit e Leonie. O cinema brasileiro já homenageou Pagu várias vezes: além de documentário de Rudá de Andrade, há o filme Eternamente Pagu, dirigido por Norma Benguell, no qual ela foi interpretada por Carla Camurati. Patrícia Galvão aparece também no filme O Homem do Pau Brasil, de Joaquim Pedro de Andrade, e foi tema do documentário Eh, Pagu!, Eh!, de Ivo Branco. Lúcia Teixeira lembra ainda, em seu livro, que os anos de prisão, tortura e perseguição deixaram muitas marcas em Pagu, o que a levou a tentar o suicídio duas vezes — a primeira, em 1949, quando deu um tiro na cabeça, durante estada na casa do artista Flávio de Carvalho, em São Paulo; e a segunda, em setembro de 1962, quando, diagnosticada com câncer nos pulmões, foi a Paris submeter-se à cirurgia no Hospital Laennec. Com o fracasso da operação, "ao antever o sofrimento e a morte iminentes, atira no próprio peito", escreve a autora. Mais uma vez, sobreviveu. Retornou, então, para Santos, onde morreu em dezembro. ________________________ (*) Publicado no caderno cultural Dois + do jornal A Tarde, de Salvador-Bahia, dia 28/8/2010, pág.3. (**) Adelto Gonçalves é doutor em Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo e autor de Gonzaga, um Poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), Barcelona Brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher Brasil, 2002) e Bocage – o Perfil Perdido (Lisboa, Caminho, 2003). E-mail: marilizadelto@uol.com. br Adelto Gonçalves |
http://www.blog.comunidades.net/adelto/index.php?op=arquivo&idtopico=4215343
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